sábado, 12 de novembro de 2011

numa fase sem títulos nem parágrafos aka
ela

ela chegou de repente, de volta de um ano longe. conhecer mesmo, até então eu não conhecia, pode-se dizer que só de vista. mas era uma presença dessas que se diz ter "brilho". sim, é uma definição bem cafona, mas não há o que descreva melhor. a beleza e a leveza seduziam a atenção, o jeito desenrolado acrescentava charme, mais do que suficiente pra criar uma dessas amizades unilaterais que eu tenho hábito. daí houve o ano de intervalo, informação que eu só teria muito tempo depois. e, com essa volta, passaram a existir algumas compatibilidades de horário, algumas coexistências, uma presença mais firme, uma troca de uma ou outra palavra, comentários amenos. até que um dia pegamos o mesmo transporte público, com destinos levemente diferentes, saindo do mesmo ponto de partida. sentamos cada qual num lugar, separados, com o ônibus ainda vazio. à medida que íamos avançando no percurso, o ônibus foi se enchendo até ficar insuportável, depois se esvaziando e enchendo de novo, um fluxo conhecido pelos passageiros de longa data. chegado o momento da descida, ela foi se locomovendo rumo à porta de saída com antecedência calculada e, no meio do corredor, provavelmente por causa de alguma freada ou de um golpe da inércia que nos acomete durante as curvas, acabou pisando no pé de uma senhora. nem é preciso dizer que intenção não houve, o que não torna o pisão mais agradável a quem o recebe. desculpou-se, com a simpatia que lhe é característica, e recebeu de volta não só a cara fechada desse tipo de vítima, mas também uma série de agressões verbais, um falatório nervoso sem fim que não tinha quê nem por quê. ela, sem ceder ao impulso de responder na mesma moeda, desculpou-se mais uma vez e, sorriso no rosto, desejou um ótimo dia à senhora ranzinza. esta, provavelmente se sentindo então vítima de cinismo, nunca mais fechou a porteira da reclamação. sem fazer-se de rogada, ela, cujo momento de descida finalmente tinha chegado, desceu e, do lado de fora, foi atravessando a rua de costas e mandando beijos, desejando felicidades sinceras à senhora amarga. depois disso, não tinha mais como não ser.

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