finalmente vi o vídeo e quis escrever um gole. é tão raro ter tempo e vontade em confluência espontânea que não há como frear.
fiquei a princípio decepcionado de ter perdido ao vivo, mas resta a expectativa de outras apresentações. a lacuna se deve a fatores os mais distintos, alguma politicagem até, mas seu trabalho de captação foi bem competente, o suficiente pra resolver isso em partes. aconteceu então que me senti atônito, mais ou menos na altura do diafragma. e o que vem é a percepção crua e um tanto ignorante que grudou, (mal) organizada na medida em que as ideias permitem.
as pessoas vão, depois vêm, depois vão e vêm, depois começam a interagir, depois em círculo, tudo isso acompanhado de um crescendo no som, na luz, no gesto. isso foi me dando uma angústia, um perfume (que talvez seja só cheiro mesmo) de rotina. me fez pensar bastante nesta outra dança, de que já falamos e que me arrebatou na mesma medida. a afinidade é clara.
emoldurando, o figurino simples e direto. consegue ficar em segundo plano sem sumir, ser colorido sem pesar a mão na cor e, mais importante, deixa dançar também o suor, que me é tão caro. acho que é isso que faz mais diferença pra mim do clássico ao contemporâneo. saem as sapatilhas de ponta que massacram os pés, os figurinos pomposos, o cenário grandiloquente, a busca maquiada do gesto perfeito e distante do cotidiano. entram a roupa de todo dia, o ambiente minimalista, os movimentos mais desprendidos do conceito de beleza clássica, o suor que sai da virilha sovaco peito cu pernas rosto couro cabeludo.
da secreção, a etimologia já diz: "separação (das partes), dissolução". é o resultado daquilo que se faz, daquilo que se perde, do ponto de vista mais prático ao mais abstrato, e ela não pode ser ignorada. dançar com o suor conta o esforço envolvido ali, o domínio de corpo, além de agregar ao que é narrado na dança, ao que acontece no palco.
e quando começam a soar os pratos, a coisa fica tão linda. vão nascendo umas simultaneidades embaralhadas, em lampejos, o mais puro reflexo da era do excesso de informação. foi esse elemento que me deu o clique da dança, assistindo isto dois anos atrás. as coisas acontecem aqui, ali, de repente do outro lado, um cruzamento conecta dois ou mais bailarinos, que continuam cada um no seu rumo. não tem mais jeito, não dá pra ver tudo. há que se fazer escolhas, até aí.
então vira uma convivência. os tropeços, apoios e atiramentos deixam fazer tantas leituras que não cabe tentar desenvolver aqui. os protagonismos vão mudando ao sabor do olhar e do desespero de apreender tudo. é isso, é assim, é o tempo todo, cada hora uma coisa puxa de um lado, interage de uma forma. a única maneira é ir lidando com todas elas como vêm.
e é nisso que a dança tem me pinçado. saber veicular tanta coisa com o corpo é de uma clareza tão grande de si que faz toda diferença. sinto vontade de dançar pro mundo como danço quando estou absolutamente sozinho em casa, de aprimorar isso, de entender a técnica que existe por trás pra poder brincar com ela. mas, de novo, é tanto com que lidar que esse front talvez precise esperar um bocado. arquiteto pra que não demore muito.
me despeço suado.
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