quarta-feira, 28 de abril de 2010

considerações musicais aka
un vin qui ne donne pas l'ivresse

estava ouvindo samba saravah, na voz da stacey kent pela primeira vez, e nem sabia que era esse o nome da versão em francês de samba da bênção, fui pego de surpresa.

pra quem não sabe, essa música ocupa o meu top bem pequeno -- não sei se top 3, 5 ou 10, mas algo por aí -- e é ela que eu elejo pra tocar na virada de ano, já há alguns três ou quatro anos. parte de uma tradição mezzo brega, mezzo alegria bêbada que eu pretendo sustentar até o fim da vida, que a música, felizmente, é daquelas que não perdem a validade e eu sou brega mesmo.

a minha versão preferida é a da bethânia. o vídeo do link é bem tosco, mas foi o único que eu achei não ao vivo, com a versão do "quanta falta você me faz", que é impecável como um todo. aliás, o santo youtube me trouxe de volta a bethânia jovem, brejeira (não podia ter palavra mais adequada), junto com o paulinho da viola.

enfim, a versão francesa da música é do pierre barouh, que tem aqueles vídeos impagáveis junto com o baden, se não me engano parte do mesmo documentário da bethânia jovem.

e eu tenho essa que mora no meu ipod, na voz da elis e que (!) não encontrei no onisciente senhor seu tubo. mas eu tenho um bom coração pirata e subi aqui, oiça. com uma alegria de dar gosto.
a elegância do ouriço aka
boa surpresa

estou lendo o livro que tem o primeiro título, de muriel barbery. por pura obrigação, de início. e mal cheguei na página 100, mas a porteira letrada (e ignorada) de um prédio parisiense de alta classe é bem o tipinho do meu gosto. dá uma olhada nesses pedaços -- traduzidos assim, no susto:

"à la poursuite d'octobre rouge foi o filme do nosso último encontro. quem quer entender a arte da narrativa, precisa assisti-lo. a gente fica se perguntando por que a universidade é tão obstinada em ensinar os princípios narrativos se valendo das teorias de propp, greimas e outros pensadores, quando bastaria investir numa sala de projeção. premissas, intrigas, ações, peripécias, buscas, heróis e afins: basta ter o sean connery com uniforme de tripulante de um submarino russo e alguns porta-aviões bem posicionados."

ou ainda:

"então, como eu tava falando, fiquei sabendo hoje de manhã ouvindo a france inter que a contaminação das minhas aspirações a uma cultura legítima por outras inclinações de cultura ilegítima, não é um estigma do meu baixo nível nem do meu acesso solitário às iluminações espirituais, e sim uma característica contemporânea das classes intelectuais dominantes."

e assim, estamos todos liberados pra tentar gostar do que há de mais refinado e também, sei lá, assistir superpop e apreciar qualquer porcaria que convenha.

vamos ver como andam as outras trezentas páginas.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

amigos famosos aka
como chegar à elke maravilha em 5 parágrafos aka
tentando exclusividade

um desses finais de semana aí estive na casa dos meus pais e passeei pela coleção de cds, que sempre foi mais do meu irmão do que minha. responsável pela organização milimétrica em ordem alfabética, ele era o hitler dos cds e me fazia repor as caixinhas dele que estavam com os dentes quebrados, fosse culpa minha ou não. coisas de irmão.

é engraçado ter esses contatos assim, com uma tecnologia que está morrendo. lembro de quanto dinheiro já foi gasto com isso, de como era sinal de status ter um gravador de cd e de como eu era feliz com meus álbuns, sempre acompanhado do discman, que precisava ser mantido imóvel pra não atrapalhar a música. num tempo (que nem faz tanto tempo assim) em que ipod não era realidade.

aí, vendo a discografia completa do pato fu até uma determinada época, me lembrei de como eu gostava deles. ainda tenho alguma simpatia, mas não todo aquele fôlego. acabei chegando nessa música, que foi a minha porta de entrada pra música deles. a fernanda takai (que esteve no ensaio de ontem) dizia que era sobre as idas e vindas da vida dela, que sempre mudou muito de cidade por conta do trabalho do pai.

a partir disso, por conta dessa aproximação de realidades que, na minha cabeça, queria dizer muita coisa, a gente virou amigos -- também na minha cabeça, mas sem configurar esquizofrenia. éramos os dois meio que forasteiros, deixando algumas coisas pra trás. vida, amigos, hábitos, colégios, cidades. o meu roteiro nem foi tão grande assim e hoje eu até agradeço por isso tudo. pensa bem, pelo menos não virei personagem exclusivo de um único microcosmo interiorano, que vem a ser das coisas mais sufocantes no meu ponto de vista. mais tarde descobriríamos também o gosto pela nara leão, um bom tanto de afinidades.

outra que caberia pra ser nossa amiga é a elke maravilha. que me assustava, na época, mas hoje dá pra entender melhor. ela é uma mulher inteligente escondida por trás daquele monte de exuberâncias. perucas das mais diversas, anéis de cabeça de passarinho, batom a não mais poder... aquilo que se chamaria de visual um pouco carregado. e o dado mais peculiar: ela é apátrida. ela tem um documento oficial que a reconhece como sendo de terra nenhuma.

aliás, quando elke maravilha esteve numa das cidades onde moramos, passou pelo banco onde meu pai trabalhou a vida toda e foi aquele parlatório. pode ser exagero da minha memória, mas meu pai ganhou um beijo dela na bochecha, o que corresponde quase a receber um beijo de batom dado pelo mick jagger ou pelo steven tyler: a marca vai mais ou menos do lóbulo até a nuca, fazendo o caminho mais comprido.

enfim, um bom grupo: o filho do gerente do banco, uma cantora e uma ex-modelo exuberante e apátrida que fala várias línguas.

domingo, 11 de abril de 2010

fim de semana parte 2 aka
peça de sábado aka
in on it aka
porcaria... porcaria... algo familiar aka
brighter than a lucky penny

sábado foi dia de in on it.

a peça estava em temporada na faap até hoje. felizmente pra quem perdeu, eles voltam no eva herz, que eu não conheço, mas que ocupa um lugar melhor na minha preferência do que a faculdade de mensalidades de dois mil reais (nítido preconceito meu, que não pago, mas não estudo em lugar com portais de mármore) que invariavelmente influencia no tipo de público que frequenta a peça. a partir de 8 de maio, anotaí.

me acomodo e, bem na minha frente, está a tiazinha. uma moça normal por quem o brasil inteiro já ficou de quatro quando ela usava uma máscara e rebolava na tv e que mora numa playboy que deve existir em algum lugar no meu quarto na casa dos meus pais, acredite se quiser. curioso que, poucos dias antes, eu tava conversando sobre um texto qualquer da folha (que eu não consegui encontrar o link agora) sobre a tal, que não é nem de longe uma recorrência nos meus dias, dizendo que quando ela resolveu "virar" a suzana alves, acabou despontando para o anonimato. hah.

voltando... sobre o que é a peça? eu não sei dizer direito, mas nem eles sabem. o importante é que é centrada em diálogos afiados de daniel macivor (um xará canadense que eu preciso conhecer melhor), com atores muito bem entrosados e um não cenário que se enche com os dois.

minha santa ignorância cênica não me permite grandes acrobacias argumentativas, mas assim como dois nomes fazem a história parecer ser verdade no caso dos doze apóstolos, os dois homens fazem tudo parecer verdade, mesmo brincando com a verossimilhança na inversão de papéis sem fim. e o texto, meu amigo, é uma delícia. leve, leve. é o tipo de coisa "banal" que eu gostaria de escrever, e chega numa certa universalidade temática que deixa a gente se identificar mesmo com nomes como taylor, raymond e afins.

a peça-que-não-é-espetáculo também coloca mais uma brenda nos meus anais pop, junto com a chenowith (a minha personagem preferida da melhor série de que se tem notícia), e mostra que o fernando eiras e o emílio de mello são dessas pessoas com quem eu adoraria tomar uma cerveja sem deslumbre nem pretensão, nem chamando com nome e sobrenome assim, mas eu posso estar confundindo pessoa e personagem.

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a parte três do fim de semana, um coup de genialidade do scorsese, vai ter que ficar pra amanhã. uma satisfação pra mim mesmo, já que leitores assíduos não são tendência por aqui.

o último título é parte da música que permeia a peça, vale dizer sem estragar a surpresa.
fim de semana parte 1 aka
show de sexta aka
abalando bangu aka
pesando a mão nos parênteses

leia até o fim, por favor.

uns dez dias depois de um périplo pelo ibirapuera no dia em que eu andei mais que égua de padeiro, carregando os sete volumes do proust numa edição só (leia-se muito peso) e um guarda-chuva tamanho família (precisa mesmo dizer que não choveu?) pra comprar o ingresso antecipado em plena tarde de quarta-feira (eu posso fazer isso às vezes -- bem às vezes --, mas posso), cheguei no show do lucas santtana sexta-feira no auditório ibirapuera (desta vez chovendo e sem guarda-chuva) e me deparei com pouca gente. o que significa que a caminhada excessiva foi meio inútil e que as pessoas não ficam sabendo o que acontece de bom por aí, mas beleza.

o show começou com as poltronas bem vazias, cheio de espaço entre as gentes. o band leader com aquele negocinho que eu não sei o nome e que parece brinquedo de criança, apertando os botões que soltavam os sons e enchendo aquele lugar todo. um show contido, quietinho, parecendo até tímido, seguindo à risca a setlist do programa e bem próximo da gravação original (pelo que meu ouvido leigo consegue distinguir). tudo bem que eu acho meio brochante isso de saber o que vai tocar depois, e é meio contraditório da minha parte, já que eu não consigo nem assistir um filme sem saber quanto tempo ele dura, mas enfim.

foi basicamente o sem nostalgia com algumas surpresas: uma versão de grains de beauté, outra de mensagem de amor (que é uma pérola na voz dele) e abololô (que é uma colaboração dele com a marisa monte, perdendo a virgindade em show dele).

até a última música -- amor em jacumã, que dispensa apresentações aqui --, ele tinha se limitado a dizer "obrigado" entre os aplausos e finalmente começou a soltar um dedo de prosa. disse que o silêncio era por conta da concentração da primeira vez que faziam esse show especificamente.

fim, agradecimento, aplausos. aplausos que continuam pedindo pra voltar e... os músicos voltaram.

pausa pra falar que acho isso meio questionável. desnecessário como os protocolos reais, por exemplo. óh, que caos, michelle obama colocou a mão nas costas da rainha da inglaterra, grandes merda. afinal, se tá planejada a volta, por que fingir? sebemque é mais ou menos a mesma lógica do choro dado pelo garçom camarada nas doses etílicas controladas demais no boteco de cada dia, tem lá seu sentido, é um processo de sedução definido, como quase todos processos de sedução. sinal de cortesia, da mesma corte que segue os tais protocolos reais. fim da pausa.

aí tocaram uma música que não me lembro exatamente agora e foram embora, deixando o lucas lá, sozinho no canto dele quando (arregalo de olhos, no sentido de arregalar e de ser um regalo mesmo) o palco começou a se abrir.

eu confesso que sempre tive essa curiosidade, de ver o auditório com o palco aberto. ouvi dizer de um show da marina lima -- que a mí no me gusta -- que ela encerrava com o palco aberto e saía cantando pelo parque ou coisa assim. e sempre ficava com essa expectativa, que finalmente foi realizada. prova cabal de que o niemeyer é mesmo um gênio (igual a chuva escorrendo na verticalidade do auditório no cigarrinho pós-show), apesar de todos os pesares que pelo menos eu tenho contra ele.

começa a tocar ripple of the water. a chuva, que tinha dado uma trégua, tombou do céu. de arrepiar até os últimos pelos do orifício mais pudendo e escondido da mais carmela. eu, moça que sou, enchi os olhos d'água. mas o rapaz não deu nenhum ponto sem nó. a letra diz "somethings have come to us, on the wind, feeling the breeze" e a breeze chegando, de fato, na plateia, que já estava em polvorosa e, felizmente, mais cheia do que no início do show.

foram alguns poucos minutos, mas desses de encher os olhos, ouvidos, cabeça, coisa de contar pros netos, guardar no arquivo de coisas lindas da vida, uma ascese que eu imagino que ocorra numa bela de uma foda onipotente (nunca se sabe...). lucas saiu e deixou o público lá, aplaudindo as árvores.

e me lembrei da entrevista da última serafina com o ricardo darín, o ator de todos os filmes argentinos, que, perguntado sobre o que achava das exibições em 3d, disse que o próximo passo seria incorporar os aromas e que isso seria incrível. foi bem isso, só que de verdade. e foi incrível.

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tem no diginois uma foto dele no palco com o fundo aberto e falando do nervosismo do show.